Sócrates (470 – 399 a.C.) foi um filósofo grego que revolucionou o pensamento ocidental. Ao contrário da maioria dos filósofos antigos, que, para se dedicarem ao ócio filosófico, deveriam possuir posses para não precisarem trabalhar, Sócrates era filho de um artesão e de uma parteira, tendo exercido o ofício do pai em sua juventude e ingressado em campanhas militares em guerras.
Dentre essas, a Guerra do Peloponeso, em que Sócrates lutou em destacamento em 431 a.C e em outro por volta de dez anos depois. Soldado corajoso e de grande resistência física, Sócrates obteve benefícios das características da cultura ateniense para os jovens, envolto na prática de esportes e na formação científica e política, o que conferiu ao pensador a sua personalidade questionadora.
Sócrates ficou conhecido por ter iniciado um período da Filosofia Grega Antiga, o Período Socrático ou Antropológico, que teria surgido como uma nova saída em relação aos estudos dos filósofos anteriores (classificados como pré-socráticos). A filosofia passaria, a partir de então, a abordar questões essencialmente humanas, ou questões advindas das relações humanas e do convívio em sociedade, como a justiça, o bem, a moral e a verdade.
Contam os seus biógrafos que, certa vez, ainda em sua juventude, Sócrates visitou o Templo de Apolo, na cidade de Atenas, onde ficou marcado pelas inscrições entalhadas no pórtico do templo: “conhece-te a ti mesmo”. Essa máxima do autoconhecimento tocou o filósofo, fazendo-o perceber que qualquer conhecimento posterior do mundo requeriria, antes, um conhecimento de si mesmo.
Sócrates afirmava a sua ignorância, dizendo a frase que, segundo ele mesmo, definia-o: “Só sei que nada sei.” Esse reconhecimento de sua ignorância foi uma marca fundamental para estabelecer o seu caráter questionador de sábio, pois o reconhecimento da ignorância leva à busca pelo saber, ao passo que a soberba intelectual leva à estagnação.
Na mesma ocasião de visita ao templo, o jovem pensador consultou o Oráculo de Delfos, que o qualificou como o mais sábio dos homens da Grécia. Isso foi tomado por Sócrates como uma missão – levar a sua sabedoria consigo e adiante.
Sócrates passou a vagar pelas ruas de Atenas conversando com as pessoas, questionando-as e ensinando-as, por meio da prática, o seu método. Hoje, não temos escritos deixados diretamente por Sócrates. O que é conhecido do filósofo são relatos de seus discípulos, principalmente Platão e também Xenofonte.
Também existem relatos de seus detratores, como Aristófanes, um comediógrafo grego que satirizou a imagem de Sócrates em várias de suas peças. Para se moldar à personalidade de Sócrates e reconstruir a sua filosofia, é necessário, então, estabelecer um diálogo intelectual com aqueles que escreveram sobre ele.
Método socrático
Sócrates dizia-se um “parteiro de ideias”. Assim como sua mãe, que trazia bebês ao mundo, Sócrates trazia ideias, mas não dele mesmo, mas, sim, das outras pessoas, que ao conversarem com ele, passavam pelo seu método. Sua missão era, sobretudo, a missão do diálogo, que levava as pessoas à “evidência da própria ignorância: situação que, não sendo ultrapassada, prenderia a alma num estéril engano”.
O método socrático de trazer as ideias das pessoas consistia em dois passos:
- Maiêutica – uma ferramenta retórica/argumentativa que consistia em sucessivas perguntas sobre a essência de algo, sobre o que é algo;
- Ironia – a resposta, em tom irônico, dada ao interlocutor servia para desconsertá-lo e mostrá-lo que o conhecimento que ele julgava ter estava, na verdade, incorreto.
O método socrático conferiu ao filósofo o êxito de sua missão: levar a sua sabedoria ao povo ateniense. Ele foi um dos primeiros a tornar a questão pela essência das coisas assunto filosófico e, lutando contra o relativismo sofístico, falou da necessidade de se defrontar, não com as opiniões, mas com a verdade.
Sócrates e a Atenas Clássica
Sócrates nasceu em uma época de ouro em Atenas, tendo vivido as heranças de Sólon e Péricles, a democracia grega e o florescimento cultural e político que tanto ficou conhecido pela posteridade.
Nessa época, a atividade filosófica grega já tinha sido iniciada há alguns anos. Sofistas como Protágoras e Górgias já prestavam seus serviços aos jovens atenienses, e a política era assunto de todo cidadão grego. O sistema político permitia que todos os cidadãos pudessem legislar e participar do judiciário, como membros do júri, o que necessitava de preparo.
Sócrates foi um homem que teve destaque por ter buscado esse preparo. Grande entendedor de política, de filosofia e da sociedade, o pensador beneficiou-se de cada aspecto que a cultura de sua época poderia fornecer aos cidadãos.
Como soldado, também serviu com coragem ímpar as campanhas em que participou, mas a mesma coragem em campo de batalha aparecia em sua imagem na vida pessoal, o que o fez angariar algumas inimizades. “Diante de qualquer forma de governo e de qualquer autoridade constituída, Sócrates prestava primeiro obediência aos ditames de sua própria consciência”.
Despertando a curiosidade e a amizade dos jovens e a ira dos mais velhos, dos políticos e dos mais ricos, Sócrates foi vítima de uma perseguição política, que resultou em uma acusação, nos consequentes julgamentos e na condenação à morte.
Morte de Sócrates
Após gerar incômodos e burburinho entre pessoas influentes em Atenas, Sócrates recebeu uma acusação que partiu, principalmente, do poeta Meleto e do político e orador Anitos. “A acusação era grave: não reconhecer os deuses do Estado, introduzir novas divindades e corromper a juventude”. Isso significava que o pensador, já passado dos setenta anos de idade, seria julgado por um júri composto por outros cidadãos da pólis, e sua pena seria definida a partir do julgamento.
Os relatos do julgamento de Sócrates podem ser conferidos no diálogo de Platão, Apologia de Sócrates e também em Defesa de Sócrates, do também discípulo do pensador, Xenofonte. Sócrates foi julgado e condenado por não se deixar levar pela ordem estabelecida, mas sempre questionar o conhecimento tido como correto.
No tribunal em que o filósofo foi julgado, a defesa ficava por conta do réu. Ao contrário do que muitos réus faziam na época, Sócrates não lançou apelos misericordiosos, utilizando sua posição social, sua família e seus filhos como meio de comover os membros do júri. Essa prática é vista pelo Direito, hoje, como uma tática falaciosa. Trata-se do argumentum ad misericordium, ou apelo para a misericórdia, que não apresenta uma estrutura lógica argumentativa, mas tenta vencer pela emoção.
Sócrates recusou tecer esse tipo de defesa por considerar que um apelo à misericórdia seria quase que uma aceitação da denúncia. Sócrates manteve-se firme em apresentar argumentos que contradissessem as falas de seus acusadores, porém essa atitude não foi suficiente para que o filósofo fosse absolvido.
Condenado pela maioria dos votos, cabia a Sócrates fixar a sua pena. Meleto queria a pena de morte. O exílio, que seria também um exílio político (vida que Sócrates não queria para ele), também foi cogitado. Amigos sugeriram para ele o pagamento de uma multa. Sócrates, porém, não aceitou nem o exílio e nem a multa, pois sua consciência consideraria esse ato uma espécie de aceitação da culpa, que ele julgava não carregar. Ficou definido, então, que sua pena seria a morte.
Sócrates dizia que, ao conversar com as pessoas pelas ruas de Atenas, ele estava levando a sua missão, com responsabilidade, à frente – aquela missão que ele julgou ter ao conversar com o oráculo, de levar o conhecimento aos outros por ser o mais sábio homem da Grécia.
A virtude, julgava Sócrates, só poderia ser obtida mediante o conhecimento verdadeiro dos conceitos e das essências, e a sua missão era mostrar às pessoas que elas poderiam obter tal conhecimento, começando por um processo de autoanálise que findaria no questionamento e no conhecimento do mundo. Por perturbar a ordem vigente, esse foi o real motivo da condenação e da sentença de Sócrates.
Em 399 a.C., o filósofo recebeu o cálice contendo cicuta, o veneno utilizado para sua execução. Ele mesmo bebeu o conteúdo do cálice e, poucos minutos depois, morreu.
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